Se eu recebesse um tiro em minha cabeça, morreria ou teria o grande trabalho de limpar a sujeira?
Acho que não se trata de coragem, mas hoje sinto que estou meio inverno. Quem dera ser eu a primavera, assim me sentiria vivo e jovem outra vez. Isso me faz pensar lentamente.
Faz frio.
Contei as folhas mortas.
No meio delas achei a carta de adeus.
É mais fácil ter ódio no coração do que gordura.
Li. Não gostei. Mas foi meio que uma válvula de escape. Serviu. Encaixou perfeitamente sobre minha decepção. Agora não tem mais jeito. Essa dor de cabeça que parte da nuca e segue até os olhos, por dentro, contaminando-me.
Volto a ler a carta. Agora dentro de casa. Na lareira. Confortável. E percebo que existe uma familiaridade. Um trecho que conheço. Ela não usou de suas próprias palavras. Ela abusou de outras literaturas.
Vi a virilidade de Arnaldo Jabor, a violência de Nelson Rodrigues, o sarcasmo de Fernando Veríssimo, a secura de Clarice Lispector… vi tantos outros textos e provérbios que a única coisa que consegui identificar em particular foi seu nome. Assinando. Roubando as idéias, assim como havia roubado meu coração.
Não ressaltou. Não fez menção a nada. Julgou ser seu. Apenas.
Quando ouvi o canto dos pássaros anunciando que o dia terminava calmo e intempestivo, saquei minha arma contra essa monotonia que me corroia e que eu sabia não ter fim, dando, primeiramente, um tiro no ar. Um sopro de oxigênio. Abstrato. Mortal. Causando-me falta de bom senso e uma ausência de adrenalina.
Morfina.
Não.
Morfina não.
Deixe eu sentir dor até cair. Deixa eu me lambuzar de um sentimento inalterável.
E sobre o amor, esse não devia ser um sentimento. Esse devia ser uma mordida num sanduíche de atum. A cada mordida, uma vontade louca de repetir a ação. Que por sinal tem seu fim. Aliás, tudo. Nada escapa. Sempre foi assim.
Joguei a carta sobre o fogo crepitante. Diga-se de passagem, na medida em que a carta queimava, eu ardia por dentro, pensando nas conseqüências de meus atos. Pois aprendi sendo inverno, que não adianta ser honesto ou simpático, ou não fumante… nada obedece a razão. O amor é cafajeste, ama o inalcançável, se magnetiza por algo contrário, deseja a falsa consideração.
E eu querendo apenas ser eu.
Não valho mais nada. Eu digo.
Quando vier bater a minha porta, traga-me esperança.
Quando vier fazer algazarra, avise-me antes.
Quando quiser fazer parte, sinta-se primeiro.
Quando pensar em por um fim, vá sem olhar para trás.
Hoje sou inverno, e essa sensação de gelo derretendo só pode significar uma coisa. O aquecimento global está me matando. Ou seria a presença de seu corpo quente que de minha cabeça não pensa em saltar. Eu devo ser louco.
Eu devia parar de procurar cartas de Adeus.
Primavera... estação das flores...
ResponderExcluirMas o que seria da primavera sem o VERÃO, pra que o calor de seus dias, a luz do sol faça florescer vida, cor, amor...
E o VERÃO sem o OUTONO? Outono que transforma, que leva o sem vida pra lembrar o momento da renovação. E vem o INVERNO, encarado muitas vezes como algo ruim... qual nada. Inverno é reflexão...
Refletir sobre as oportunidades... de fazer florescer o novo, intensificar o que brilha em nós, transformar o que é preciso.
Enfim, inverno é bom... afinal, no frio o que se quer é aconchegar...
uma lareira (dentro do coração) pra quebrar o gelo.
Vai um fósforo aí, amigo?