Era um farol simples, pequeno, que mais se parecia com um míssil preso ao chão. Enferrujado e sem cor, fazia acontecer à noite um belo espetáculo, ou devia, pois naquele instante o que se podia degustar era uma linda manhã.
Aquele farol, pelo menos pra mim, marcava uma grande fase da vida impossível de se resumir. Mas em pequenas palavras o que posso oferecer é uma relação de dependência. Meu espírito dependia daquele momento, meu coração dela dependia. Éramos jovens e sete, mas a maior parte do tempo tive a ilusão de estarmos a sós em meio aquele mar de expectativas.
Seus cabelos não cansavam de bailar, deixando as ondas, que pela rotina cismavam em bater nas rochas, enciumadas. O vento era agradável, numa velocidade suficiente para que a dança pudesse ser suave, assim como seu rosto que se escondia atrás dos óculos por um motivo aparente. Vestida com sua saída de banho que mais parecia massagear sua pele dando um leve contorno em suas curvas tão libidinosas, fotografei-a em meus sonhos e em minha mente para que toda via pudesse vê-la sempre que a lembrasse.
E hoje eu me lembro.
Lembro dela sentada na pedra, ao lado do farol, de frente pro mar. Lembro da ponte de madeira com algumas ripas quebradas, das fotos tiradas por João, alguém especial que, se não fosse por ele, jamais estaria vivenciando aquele instante divino. Lembro do horizonte, do sol a procura de espaço, da chuva em plena tarde, da ilha repleta de casinhas de madeiras e outras de alvenarias, do porto, das brincadeiras em alto mar, das águas vivas, do local abandonado, da trilha, do medo de segui-la, do gosto de água salgada. Ah… Como eu lembro. Desejando que tudo pudesse voltar a acontecer todos os dias, ou que aquele dia jamais pudesse ter fim.
Sei que não é o fim, porque dela necessito. O que vem dela é o que me inspira a ser feliz. Mas o dia na ilha ficará marcado para sempre em minha memória. Será o início, independente de como ou do quê.
Pode-se apreciar minha exatidão ao ponto de julgar-me um bobo, petulante satisfação, pois não ligo. A começar por mim, pela minha própria manifestação em dizer que sou assim, errante, simples, um cara que vive sempre por detrás das sombras esperando a felicidade trazer um pouco de luz em vida. Sei o quanto minhas idéias são surtadas, contraditórias a de grandes vencedores, mas em mim não há de ser diferente, esse é o meu jeito, sou platéia, sou o mostro de mil cabeças sempre aguardando o grande final.
Mas aquele farol. Eu me lembro. Foi o dia em que eu deixei meus problemas em algum canto do armário, peguei minha mochila que, de tanto entusiasmo, cabia-se somente duas peças de roupa. Havia algo em mim que se via de longe, do horizonte talvez… e sendo na ponte ou na pedra, no saveiro ou no oceano, não importava o quanto era vislumbraste a visão que podia se ter daquela ilha tão mágica, nem se era possível ver as cachoeiras, o pôr do sol, o casal de namorados a beira de uma praia deserta… nada disso importava ou não se valia a pena, porque em meio a aquelas belezas naturais, lá estava ela, expondo sem sentir toda a sua perfeição. Eu não havia mais o que olhar. Eu não havia mais o que fazer se não sentir a brisa e o cheiro que dissipavam de seus cabelos.
E daquele dia sobram-se apenas meio litro de esperança, algumas fotos e o cheiro de terra.
Nada mais.
Com alguns pensamentos em mente, dos quais, três deles foram ao lado do farol. São eles:
O tempo passa.
A vida acontece.
A distância separa.
Hoje meu coração está rompido. É nessas horas que pedimos para não termos memória. Aquele farol… eu me lembro. As pessoas não fazem o que deveriam fazer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário