Um cara com suas promessas

Na virada do ano ele havia prometido mudar. Jurou pra si mesmo e pra Deus que faria a diferença, que não pediria nada, somente faria a sua parte.

Era uma noite linda, com fogos de artifícios, e da sua janela podia se ver as pessoas festejando nas ruas, outras nas janelas das casas jogando papéis picados, trazendo a famosa ideia de transformação.

Tudo estava na mais perfeita harmonia.

Não havia momento melhor pra agradecer o ano que passou, mesmo que tenha sido um ano ruim, trouxera muitas experiências.

Ele pensou. Ano que vem vai ser um ano diferente.

E assim passaram-se os meses daquele tempo cheio de projetos, chegou a fazer muitas coisas que jamais pensou em fazer, acertou por inúmeras vezes, mas pode perceber que tudo era sempre muito difícil de alcançar, suas metas eram metas que só os heróis poderiam atingir. Sentia orgulho de si. Notou que estava à frente dos demais. Seu ego chegou a tomar conta, mas recolheu-se na humildade, pois sabia que tudo era ilusão, bastasse um aperto no peito e pronto, um último suspiro de ar pra acabar com toda aquela conquista.

Daqui nada se leva.

Meus dias são vazios se não os preencho de amor.

Tenho receio de cair em tentações.

E com o passar dos dias, das horas, complicações em cima de complicações foram crescendo, se abdicou de muitas coisas, correu riscos também. Tentou no início fazer por merecer, conquistou o primeiro passo do seu grande sonho, até que suas metas começaram a cair no esquecimento, passaram a fazer parte de um segundo plano, inconscientemente. Foi se perdendo, deixou-se levar por uma imensa falta de bom senso, caiu nas garras do mundo, atravessou o deserto, perdeu-se no caminho.

Foi tudo tão estranho, de repente se viu na beira de um abismo pronto para ser devorado por alguma fera medonha. Seus passos se tornaram pesados, sua pele era oleosa, suas mãos eram suadas, nada mais fazia sentido e todas as promessas colidiram com o mais alto muro.

Mas por mais que as coisas não dessem certas, ele havia feito o maior juramento de sua vida. Havia jurado que daquele ano em diante faria tudo valer a pena. Jamais voltaria a beber, sua alimentação seria saudável, não ficaria até tarde da noite perdendo-se nas curvas, nas ruas, nos detalhes da lua a contar histórias que lhe faziam dormir sem lembrar-se de nada.

E conseguiu. De certa forma ele conseguiu. Mas ainda sim lhe faltava muito. A conquista nunca foi pra ninguém algo fácil de ser ter. Honra e glória, sorriso nos lábios… era quase impossível de se ver por completo. Os vilões desse mundo existem para que nada se torne simples demais. Ele sabia disso. Era só uma questão de tempo, talvez não fosse inteligente prometer fazer e mudar tudo em um ano. Mas assim como um conta-gotas, os anos sempre foram as etapas em que nossas vidas se dividem. Todo ano é uma promessa de um mundo novo. Ele sabia disso. Deus sabia disso, o cara do celular, dentro do carro numa rua em Copacabana também.

Somos todos iguais.

Somos todos diferentes.

É assim mesmo, nessa complexidade que vivemos…

Uma coisa é certa: quando fechamos os olhos nos enxergamos por dentro.

Não teria que ser assim.

Durante aquele ano, tudo era para se estar resolvido e nem tudo foi. Ele se desespera, havia errado com Deus. Correu para seus amigos, chorou, disse a todos o quanto se arrependia por não ser uma pessoa de palavra. Por ser uma pessoa falha. Alguém lhe disse que seu medo era bobo, que nunca ninguém foi tão longe como ele foi. Sabia que era mentira, mas aquilo havia servido-lhe de consolo. Certas palavras na hora exata levam sabedoria aos corações partidos. E aquele coração de promessas, daquele jovem rapaz falho, saiu dali recheado de ânimo.

Com o tempo pode perceber como nossos valores e tudo aquilo que acreditamos deixa de existir. Naquele momento de esperanças, Deus havia lhe permitido cumprir seus votos.

Mas…

Cumprimos no decorrer do ano…?

Enfim. É só mais uma história de papéis picados, fogos de artifícios, história inacabada e um cara com suas promessas pela metade.